Por: Bruno Jose Yashinishi.
O inglês Edward Palmer Thompson (1923-1993) é um dos principais membros da chamada Nova Esquerda Inglesa(1). Sua própria vida condiz com seu pensamento e sua abordagem da História, pois seu discurso vincula-se a questões do mundo dos trabalhadores, ao qual esteve atrelado e manteve bastante proximidade.
Para Thompson as interpretações do pensamento de Karl Marx por seus posteriores caíram na armadilha do “economicismo”, sendo que, a formação de uma classe social se dá de maneira concreta e não abstrata deixando de ser encarada como uma “estrutura” (estática) e passando a ser vista como uma “identidade” (maleável), ou seja, sujeita a transformações e mudanças levando em conta as tradições, valores, costumes, comportamento e principalmente, numa questão central, a experiência.
Em sua obra A Miséria da Teoria(2), Edward Thompson defende um marxismo “cultural” trazendo duras críticas ao marxismo “estruturalista” de Althusser e legitimando o materialismo histórico como Teoria da História ao adotar o a ideia de “lógica histórica”. Diferente da lógica analítica da Filosofia ou da matemática da Física, a lógica da História não se firma sobre pressupostos exatos ou estáticos, mas é propriamente histórica, pois firma-se nas evidências de causas necessárias e nunca suficientes adequando-se a fenômenos em constante movimento. Sendo assim, essa lógica da História é um método lógico de investigação que se detém em hipóteses das estruturas e elimina procedimentos auto confirmadores permitindo que o diálogo entre o conceito e a evidência gerador de uma hipótese seja o discurso histórico.
Sua defesa do materialismo histórico como uma teoria da História baseia-se, sobretudo em sua propriedade dialética(3). Através dessa propriedade, a lógica histórica toma consistência e Thompson elabora certas proposições comprovadoras concluindo que as “categorias históricas” que surgem no materialismo histórico são modificáveis e não “estáticas” assemelhando-se aos seus conceitos e regras investigadoras. Com isso afirma que a investigação histórica deve ser dialética, pois qualquer momento histórico é resultado de algo em direção a alguma coisa. Sendo assim, torna-se possível a experimentação da História que não revela como ela deveria ter se processado, mas porque se processou desse modo. Pode-se dizer então que para o autor os pressupostos teóricos fundam-se no marxismo pelo materialismo histórico e os metodológicos na experimentação da História possível pela dialética na investigação histórica.
As Diretrizes Curriculares da Educação Básica para o ensino de História do Estado do Paraná(4) apontam que a História precisa ser tomada como subjetiva e adotar métodos de investigação adequados. Isso faz com que a adoção de uma História dogmática e ortodoxa seja rejeitada, mas também implica em deixar de lado as discussões teóricas que implicam a não objetividade em História (DC, 2008, p.45). Ao elaborar elementos necessários à constituição do pensamento histórico, as Diretrizes supõe a orientação temporal do sujeito na relação passado/presente, as ideias históricas já trazidas pelo sujeito baseada em sua vida prática cotidiana, o modo de se trabalhar com as fontes históricas, a orientação prática e social do sujeito e sua organização através das narrativas. Em A Miséria da Teoria, Thompson oferece significativa contribuição com o entendimento dos processos históricos propostos, pois através da “lógica histórica” e da experiência, os acontecimentos não são vistos de forma linear e acabados, mas em constante devir, além de apresentar uma narrativa histórica fundamentada na experiência do historiador. Não sendo estático, mas provisório(5), o conhecimento da História pode moldar-se e ser moldado pelo sujeito temporalmente e teoricamente.
Tomando como base os conteúdos estruturantes presentes nas Diretrizes, que se referem às “Relações de trabalho”, “Relações de poder” e “Relações culturais”, a contribuição de Thompson, bem como da Nova Esquerda Inglesa é fundamental. Em primeiro lugar, esses conteúdos visam a materialidade do pensamento histórico e é de onde provém os temas históricos selecionados pelo professor em relação ao ensino (DC, 2008, p. 63.). Em segundo lugar, a concepção de uma “lógica histórica” intervém de forma particular em cada um desses conteúdos, pois sua elaboração carece de contribuições advindas de seus pressupostos teóricos e metodológicos.
Com relação às “Relações de trabalho”, o materialismo histórico defendido por Thompson busca superar a unilateralidade do economicismo e do consequente determinismo do processo histórico. A “lógica histórica” permite através da investigação dialética a própria experimentação da História e torna possível compreender a classe social como uma identidade, além de propor um resgate à própria história do trabalhador por meio de documentos não bem aceitos pela historiografia tradicional.(6) Através dessas concepções entende-se que a consciência de classe não provém de conflitos externos, mas internos da própria classe social.
As “Relações de poder”, numa ótica de pensadores como Thompson, não se limitam apenas ao campo político, mas estendem-se ao cultural e social. Através de uma investigação experimental introduz-se o conceito de “cultura política” e além de reiterar a noção de “ideologia” no discurso histórico também promove um estudo interior das relações de poder nas próprias classes sociais. Com isso, a noção de poder remetida unicamente ao Estado na historiografia tradicional busca ser superada.
A “lógica histórica” permite ao estudar as “Relações culturais” a adoção de documentos antes rejeitados pela historiografia. Além disso, a própria cultura de um povo passa a ser vista em constante construção e fruto das relações dos costumes baseados principalmente na experiência.
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Sobre o Autor:
Bruno Jose Yashinishi, nascido em 27/06/1991. Graduado em História pela Universidade Estadual do Norte do Paraná. Pós graduado em Metodologia do Ensino de Filosofia e Sociologia pela Faculdade São Braz de Curitiba.
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Notas:
- A Nova Esquerda Inglesa surge em 1956 com historiadores que rompem com o Partido Comunista Inglês ao se descontentarem com o regime stalinista. Fazem parte desse movimento além de Thompson, pensadores que contribuíram significativamente com os estudos de História Social, como Perry Anderson, Christopher Hill, Raymond Williams, Eric Hobsbawm e Maurice Dobb.
- THOMPSON, Edward Palmer. A Miséria da Teoria: ou um planetário de erros. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.
- A “Dialética” é um dos princípios norteadores do Materialismo Histórico. Seu significado aponta a um método de filosofar através de diálogo e de contraposição. Com Heráclito (544-484.a.C.) e Hegel (1770-1831) é compreendida como estrutura contraditória de uma realidade em constante movimento. Marx retoma-a como pressuposto teórico da formulação da “luta de classes”.
- Diretrizes Curriculares da Educação Básica: História. Secretaria de Estado da Educação: Paraná, 2008.
- Um conhecimento provisório não pode ser confundido com um conhecimento relativista, mas como um conhecimento possível de várias interpretações e explicações para um mesmo fato.
- A identidade assumida por uma classe social leva em conta questões oriunda de suas experiências, valores e costumes. A história do trabalhador caracteriza-se por uma “história vista de baixo”, onde a metodologia da investigação histórica inclui fontes alternativas que não privilegiem a priori os vencedores como na historiografia tradicional.
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